MINAS CONEXÃO | O encantador reino das palavras - Por: Epiphânio Camillo

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O encantador reino das palavras – Por: Epiphânio Camillo

“Deixe aflorar a fantasia e leve a arte da palavra ao seu limite extremo.” (Bartolomeu Campos de Queirós)

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Foto: Bartolomeu Campos de Queirós – Escritor de Pará de Minas – MG

Por: Epiphânio Camillo – Especialista em TI – Vice-presidente da ACMinas – Articulista

“Todos os elementos são fundamentais, mas para clareza e entendimento das mensagens, o importante é o Predicado. Muita atenção com o Predicado. Sem ele os verbos não têm sentido, os sujeitos personalidade.”

É a voz da Professora que ainda ouço com frequência, permanece desde o Curso Primário, e veio à mente quando entrei no templo daquela Casa da Palavra, o Museu da Língua Portuguesa, convenientemente estabelecida no lugar de nome mais apropriado: a ‘Estação da Luz’, na grande metrópole de São Paulo.

“Onde está o departamento dos Predicados?”, quase indaguei à atendente que me conduziu ao corredor de entrada para imergir naquele reino de magia, inundado de letras, átomos em constantes movimentos aleatórios, produzindo colisões para compor e criar outras configurações da linguagem.

Quando criança fantasiava viagem ao interior do dicionário, grande Castelo Alumbrado onde poderia conversar com as palavras, perguntar de onde vinham, como se sentiam em relação aos vizinhos, qual o prazer de se encontrar para formar frases isoladas, parágrafos que preenchiam páginas, células da construção dos livros. E nas bibliotecas? Não temiam perder-se no imenso universo de tantas letras?

Nessa brincadeira percorria os cantinhos de salas, onde se localizavam em caixas coloridas que as classificavam.

Imaginava o processo de admissão ao Castelo: portais com enormes filas à espera do acesso ao plenário austero, de onde vários Mestres Inquiridores classificavam o pretendente vocábulo segundo cânones severos:

“De onde vinham, que origem, qual passado? sementes ou seres acabados que se bastavam? como se comportavam nas ligações entre os da mesma espécie, como acolhiam e recebiam os pares, os diferentes, de outras categorias? qual o comportamento diante das cativantes invasoras? estavam satisfeitos com sua classe? se adjetivos, tinham pretensões de transmutar-se em advérbios, substantivos, verbos, conjunções?”

E assim, conversando com as palavras, na intimidade que com elas me concedi, ia aprendendo a Língua Pátria deslocando-as nos textos para lhes dar melhor conforto, torná-las preponderantes no cipoal das semelhantes, dosear-lhes a presença para repetir-se, sim, mas com sutileza tal que nem fossem notadas nem capituladas como intrusas a ocupar lugar alheio que melhor coubesse a outra.

Foi o que me veio da brincadeira de infância, agora transportada para aquele lar à minha frente, metáfora concreta de reino encantado e encantador, onde todas as palavras se localizavam e se expunham, dispondo-se a serem manipuladas, sentidas, ouvidas, copiadas.

Perscrutei o Mapa dos Falares, caminhei pela Grande Galeria, especulei na Praça da Língua, detive-me diante das Lanternas das Influências e Palavras Cruzadas, percorri a história na Linha do Tempo.

Mas, foi no Beco das Palavras e no Jogo da Etimologia, que me detive no Tempo Pretérito do verbo Amar, projetado no teto, movimentando-se entre o Perfeito e o Imperfeito como em jogo bipolar, ora se misturando em entrelaces provisórios para afirmar as suas particularidades, ambos com personalidades distintas, embora do mesmo tronco primário.

Surgiu daí, então, a lembrança do que percorri a brincar com a sintaxe, tendo no Pretérito o eixo condutor, gravado em texto de 2004.

PRETÉRITO (IM)PERFEITO

 Não li Shakespeare,

nada sei de Faulkner;

de Bilac sonetos,

Drummond tercetos.

Cervantes, quem foi?

 Mas com você, meu bem,

brisa de poemas,

descobri que a vida dicionária

é enciclopédia, carne e poesia,

metáfora entre fios de cabelos.

Lento caminhante,

perdido na etimologia

percorri entrelinhas,

parágrafos, prefácios;

vibrei com versos, síncopes, elipses.

 Errante,

surpreenderam-me as desinências,

os circunflexos, apóstrofos,

as fascinantes parábolas

e os graves diacríticos!

 Caliente,

amei tremas, vírgulas, reticências, sinédoques;

explorei crases, contrações, apostos, polissíndetos,

e apaixonado pelos derivados, fonemas, preposições,

busquei no raso léxico interpretar seus predicados.

Freqüente,

deliciei-me com as pausas, conjunções,

apreciei sinonímias,

festejei hipérboles,

rimas, interjeições!

Pedinte,

adorei bissextas métricas,

ajustei parônimos, traduzi galicismos,

corrigi os irregulares, resisti aos defectivos.

Os travessões?

 Ah! os sensuais travessões,

as frases substantivas, adjetivos,

os ardentes eufemismos, exclamações!

Quanto prazer nas ênfases e derivações.

Não me traiu a sintaxe

nem o sujeito indeterminado,

mas um erro gramatical.

Ou o tempo verbal?

Imperfeito-subjuntivo?

Nosso encontro,

alegria,

beleza de gestos,

foi pleno de hiatos,

sinais, cognatos.

 Só não gostei…

– entristeço –

do ponto final.

 Procurei, mas não vi reverências ao Predicado naquele Reino das Palavras. Em vão. Por certo, na ausência ao imponente palco iluminado da Estação da Luz, tímido nos entrelaces, encontra-se a exuberância do papel que lhe cabe na composição dos textos, incitando-me a buscá-lo em cada oração, estrofe, poema.

“Escondidas no silêncio da biblioteca, mascaradas pela escura monotonia das capas, todas as palavras estavam lá, esperando que eu as decifrasse. Eu sonhava me enfurnar naqueles corredores poeirentos, e nunca mais voltar.” (Simone de Beauvoir)

Percepção que me basta. Melhor continuar assim.”

______

(20/04/2006) – Epiphânio Camillo é articulista no Blog – Consultor de TI do Hospital Felício Rocho, ex presidente da Susesu, vice-presidente da ACMinas.

J.A. Ribeiro é jornalista e editor

www.minasconexao.com.br – jaribeirobh@gmail.com – WhatsApp/pix: 31-99953-7945

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